Pasmei quando percebi um dos mais recentes argumentos (ou será um contra-argumento?) do Bloco de Esquerda em relação à legitimidade política, ou de opinião. Segundo o Dr. Francisco Louçã (esse impagável dirigente do BE), o Dr. Paulo Portas não tem autoridade para, ao discutir a questão do aborto, falar de vida porque (sic!) não é pai, não conhece o sentir da paternidade! Segundo o Dr. Francisco Louçã (esse impagável dirigente do BE), o Dr. Bagão Félix não tem autoridade para, ao interpretar a questão anterior, chamando de neofascista à atitude do dirigente do BE, falar de fascismo (também sic!)! O raciocínio deste destacado trotskista deu já origem, é certo, a um esboço de “acto de contrição”, obviamente justificado pela proximidade das eleições, mas não a um pedido sério de desculpas pelo tique ditatorial até porque, estou convencido, o tique é absolutamente genuíno e bate certo com o perfil do partido de origem do Dr. Louçã (quem se lembra do PSR, quem tem visitado o
Anacleto?).
Perante tão decididas e iluminadas diatribes, perante tão rebuscada e implacável argumentação, resta-me perguntar:
1. Eu só conheci o sentir da paternidade uma vez, será que já estou suficientemente habilitado a discutir o aborto, a falar de vida?
2. O meu Pai conheceu o sentir da paternidade três vezes, será que me pode dar algumas lições sobre vida, sobre o aborto? Ou será que tem 3 vezes mais autoridade do que eu?
3. Eu também acho o arrazoado do Dr. Louçã digno de figurar num extenso capítulo sobre teorias anti-democratas e social-fascistas. Terei autoridade para tal?
Nada disto tem haver com a minha opinião sobre o aborto e a Lei do aborto, nem relação com o que penso dos políticos envolvidos. Acontece que mesmo sabendo que é mais fácil apanhar um mentiroso do que um coxo, fiquei pasmado com a forma tão estúpida como o Dr. Louçã se revelou…
Em 1911, em plena 1ª República, o então deputado António de Abreu Freire Egas Moniz (o meu mais ilustre conterrâneo) apresentou à Câmara de Deputados da Nação uma proposta que fazia consagrar na Constituição o direito universal ao voto. Egas Moniz, verdadeiro democrata e político de intocável carreira, estava, há 95 anos, muito à frente do Dr. Louçã.